Resenha: Luca

Lançado em 2021, "Luca" foi originalmente produzido para as telas de cinema, mas, devido a pandemia da COVID-19, acabou entrando direto para o catálogo do Disney+. Com muitas críticas positivas, mas com um acolhimento morno do público, se “Luca” fosse lançado quando eu era criança, certamente ocuparia um lugar no meu coração ao lado de “A Pequena Sereia”, o que, na verdade, não é tão diferente de agora.
Dirigido e co-escrito pelo italiano Enrico Casarosa (que já trabalhou em filmes "Ratatouille" e "Up"), "Luca" nos apresenta a história de um monstro marinho, que dá nome ao título do filme (voz do Jacob Tremblay), descobrindo o mundo da superfície, ao lado do seu amigo Alberto (voz do ótimo Jack Dylan Grazer), expondo-se ao preconceito e a violência que os humanos têm contra os monstros. Motivo esse que sua família o proíbe de ir à superfície.

Foto: Reprodução
Como parte da comunidade LGBTQIA+, foi fácil perceber como "Luca" é uma grande representação da vida queer. Apesar de estar ancorada no enredo da autodescoberta e amizade, existe uma dinâmica romântica, talvez num estado embrionário, entre Alberto e Luca.
O momento em que Alberto se incomoda com a interação de Luca com Giulia (voz da Emma Berman) o seu ciúme realça o contexto.
Pode ser que, como um fato isolado, isso não diga nada, mas o filme traz um apanhado de pistas que fazem o queer-coded brilhar. Outros exemplos que reforçam isso são as duas senhoras que vivem juntas numa casa cheia de gatos, a visão que a avó de Luca tem sobre seu neto, a necessidade deles se esconderem na forma humana para serem aceitos e até alguns conceitos visuais e narrativos comuns a outros filmes com a temática LGBTQIA+.
Um ponto que destaco também a respeito dessa desconstrução de gênero é quando a mãe do Luca (voz da Maya Rudolph) joga futebol e se diverte ganhando de todo mundo no jogo. Por mais que isso tenha perdido força nos últimos anos, não duvido que ainda tenham pessoas que não vejam com naturalidade a ideia de que meninas ou mulheres se interessem por esportes. No caso aqui, o futebol.
Uma vez imerso nessa perspectiva, fica impossível, a meu ver, assimilar o filme fora desse viés. Mas é preciso também considerar a subjetividade do qual todo o público compartilha. Uma visão não invalida a outra.


Baseada em algumas cidades italianas, o diretor retirou da gaveta algumas memórias da sua infância, na região da Ligúria, Itália, para criar a fictícia vila de Portorosso, onde se passa a história do filme. A retratação do lugar é tão envolvente e mágica que se eu tivesse que escolher um lugar para morar fora do Brasil, seria lá.
Um dos pontos altos deste enredo é, sem dúvida, o momento em que Luca se metamorfoseia em humano pela primeira vez. Esta transformação, embora sutil, irradia uma beleza que certamente deixaria qualquer animador e espectador de outrora em estado de êxtase. A trilha sonora, composta por Dan Romer, é tão envolvente e doce quanto a estética do filme. Posso afirmar, sem hesitação, que assistir a Luca é uma experiência tão cativante que poderia passar horas a fio imerso em seu mundo sem jamais voltar à superfície.
Por mais que as pessoas tenham se acostumado a esperar da Pixar um padrão de roteiro complexo para validá-la, na minha mais sincera opinião, "Luca" é a obra-prima que eu esperava e precisava.

Comentários

Postagens mais visitadas